Como mudar o Brasil para melhor, 2013-2025
E torcendo aqui para o futuro não repetir o passado
Sigo não te escrevendo. Tenho ótimas razões pessoais e profissionais. Não escapo de saudades e culpa. Pauta não falta, todo dia tropeço em uns cinco assuntos que gostaria de compartilhar contigo.
Mas o tempo não é elástico e a realidade se impõe.
Para não suspeitares que desprezo nosso relacionamento, longo ou curto, publicarei aqui alguns artigos do longíquo 2013. Não te escrevo mas não te esqueço.
Por que especificamente de 2013?
Porque encontrei aqui um arquivo com posts para o meu blog da época, no portal R7. E para minha surpresa, vários conversam com temas candentes de 2025.
Me perdoe eventuais tosquêras: eu escrevia sempre a quente e publicava no mesmo dia. Foram algumas centenas de textos entre 2009 e 2017.
Reli meu texto de janeiro de 2013 sobre Renan Calheiros e nossa nova-velha política e lembrei na hora de Motta e Alcolumbre. Lendo sobre aquela Dilma, pensei no Lula de hoje. E revisitando aquele período, me ocorreu que o cenário de então ilumina a atual relação executivo-legislativo.
E todos sabemos o que aconteceu em 2013 e depois.
Como escrevi abaixo, vivemos a “política de sempre, que está mudando o país para melhor - mantendo o que há de pior no País.”
Como mudar o Brasil para melhor
A eleição de Renan Calheiros para presidente do Senado causa revolta. Não há porquê tanto choque.
Não é pior que Sarney, Maluf, Collor, outantos outros políticos que dão sustentação para o governo de Dilma, e deram para o de Lula. Também não é pior que Antonio Carlos Magalhães ou outros do mesmo quilate, que viabilizaram os mandatos de Fernando Henrique Cardoso.
Em brincadeira de gente grande não tem santo. Você vai pra guerra com as armas e os aliados que consegue. Churchill tinha quase mais nojo de Stálin, seu aliado, do que de Hitler, seu arquiinimigo.
Vale também para empresas, aliás. Business is war.
Agora, quem vai negar que tivemos avanços nos últimos vinte anos?Controlamos a inflação. A mortalidade infantil caiu. Mais gente tem acesso sapato, xampu, iogurte e um diploma universitário.
O Brasil se tornou um ator global. A consultoria Price Waterhouse garantiu neste começo do ano: nosso país é o terceiro melhor do mundo para as empresas investirem, atrás só dos Estados Unidos e China.
Deveríamos ter avançado mais neste período, claro. O fato é que o Brasil melhorou muito nestas duas décadas de políticas de alianças.
Desde o final da ditadura, todos os governos juntaram alhos com bugalhos num grande balaio, amorfo e amoral. O PSDB, partido de oposição, fundado por políticos com histórico de resistência ao regime militar, atravessou o rubicão quando selou a aliança com o PFL, herdeiro político da Arena.
Essa política, que permite e recompensa os Renans, mudou o Brasil para melhor. A questão - e é uma questão dramática e urgente - é que é essa política não muda o principal, que é a cultura do país.
Pelo contrário, é gasolina na fogueira. Se nossos eleitos aceitam bandidos como companheiros de cama e mesa, porque não você ou eu?
Se as regras não valem pra quem tem dinheiro e influência, a única atitude racional é fazer qualquer coisa pra enricar.
Também é um modelo concentrador de riqueza. O Brasil tem pobres menos pobres que há vinte anos, mas tem ricos muitíssimo mais ricos.
Se a maior fatia da riqueza está nas mãos do governo e de empresas beneficiadas pelo governo, a impunidade é certeza e a injustiça é cotidiana.
Aqui ou em qualquer canto do planeta, os melhores países para viver, onde o governo funciona melhor, são os países em que as riquezas são melhor distribuídas.
Em que um número maior de empresas pequenas representam o coração da economia, e são o motor de geração de empregos. Em que a distância entre a base e o topo da pirâmide é uma estilingada.
No sistema dominante no planeta - vamos chamar de capitalismo? - a única liberdade de fato vem da riqueza. Não só para o indivíduo, mas para a comunidade, e a nação.
Quanto mais pobres tem um país, menos poder e menos poder de pressão tem seu povo, como um todo. E menor a liberdade de expressão, porque a imprensa é sustentada por poucos.
Vale para Estados e regiões. Compare São Paulo com o Maranhão, ou o Leblon com a Favela da Maré.
Não estamos sós. Os BRICS estão cada vez mais ricos. Mas só os ricos apitam nestes países. Está sendo criada uma nova aristocracia empresarial-governamental, a cobra comendo o rabo.
Há quem diga que a saída é a educação. Bem, os russos tem alto nível educacional. A Rússia está há anos nas mãos de um brucutu da KGB e de uma elite plutocrata.
Educação não é o que você diz, é o que você faz. Só se educa por exemplo. Não adianta um povo com mestrado, e todas as apostilas garantirem que o crime não compensa, se os Renans continuam se dando bem.
Renan é só uma engrenagem na máquina. ACM, por exemplo, era bem mais importante. Morre um, nasce outro. Sempre vai ter alguém lá no alto para dizer “ele é bandido, mas é o nosso bandido”.
E assim esses picaretas continuam ganhando carta branca para aprontar, porque são fundamentais para o projeto de poder do momento.
E é isso que o Brasil ensina para seus filhos.
Não dá pra mudar tudo do dia para noite. Mas as mudanças que buscamos tem que ser de verdade. Há que meter a mão no vespeiro.
Não basta boquejar contra Renan. Nem brigar para tirar Renan e pôr outro igual no lugar. Os beneficiados por este estado das coisas vão lutar para que as coisas permaneçam como são.
Em um País em que a presidente tem 80% de aprovação da população, não precisava ser assim. Dilma tem cacife para liderar dando o exemplo. Mas bancou Renan lá.
É a política de sempre, que está mudando o país para melhor - mantendo o que há de pior no País.
Mudar de verdade requer intransigência, radicalismo, coragem moral.
Renan só é importante de uma maneira: sua eleição é um perfeito exemplo de tudo que há de errado no nosso país. Enquanto as regras não valerem para todos, a compra de votos, eleições, pareceres, benesses, fortunas, monopólios e alvarás é inevitável.
Permitir o mal em prol de um suposto bem maior é mais que imoral: é garantia de desgraça. Porque os meios modificam os fins.
Folha de São Paulo, 19/01/2025: O ex-deputado federal Eduardo Cunha afirmou ter comprado votos para eleger Hugo Motta à liderança do MDB na Câmara Federal em 2016. A declaração ocorreu numa tentativa fracassada de acordo de delação na Operação Lava Jato. O depoimento foi invalidado posteriormente e as acusações jamais investigadas.